terça-feira, 6 de outubro de 2009

A JUVENTUDE e a EDUCAÇÃO – da política da cigarra ao sacrifício da formiga


José Carlos Vilhena Mesquita

O conceito de Juventude, pela sua complexidade psico-fisiológica, é muito vasto e de difíceis contornos. Porém, é hoje consensual que o seu escalão etário oscila entre os 15 e os 24 anos, qualquer que seja o estatuto social, religioso e cultural em que se insere. Num cômputo universal o espectro etário da juventude está avaliado em 1092 milhões de pessoas, metade das quais já constituíram família ou estarão prestes a mudar de estatuto social. A maioria desses jovens vive em países subdesenvolvidos, inseridos na esfera de influência económica do chamado terceiro-mundo. Vivem em zonas rurais, com particular incidência na África, a sul do Saara, no sudoeste asiático e na Oceânia. Neste espectro humano cerca de 65 milhões do sexo masculino e 106 do feminino não sabem ler nem escrever, e pertencem a países pobres. Acresce a esta estimativa cerca de 95 milhões de jovens desempregados, sendo certo que em todo o mundo as taxas de desemprego entre os jovens é duas vezes superior à dos adultos.
Em Portugal cerca de 80% da população possui a educação básica e só a restante ascende aos níveis superiores de instrução especializada. A percentagem respeitante ao sector da Juventude ronda os 30% da população residente, a maioria dos quais ocupados nos diversos sectores produtivos. Uma minoria dessa percentagem termina a sua fase de juventude nos bancos das universidades. Com efeito, 70% da população portuguesa com idades compreendidas entre os 15 e os 29 anos possui a instrução básica. Note-se que a escolaridade obrigatória estabelece-se desde o ensino primário até ao 9.º ano, passando a prescindir dessa obrigatoriedade a partir dos 15 anos, traduzindo-se a experiência dos últimos anos numa escala sempre crescente de incomplementaridade das expectativas nacionais de formação mínima educativa.

A política da paixão socialista

Nestes últimos anos, os governos elegeram a educação como prioridade máxima nacional, propagandeando mesmo uma espécie de “paixão política” que marcaria o sentido nacional e os Orçamentos Gerais do Estado. Se efectivamente consistiu num investimento ou num simples processo de aplicação financeira, acumulador do índice da despesa nacional, é o que veremos na próxima década, sendo minha convicção que a verdade deverá encontrar-se a meio caminho das expectativas criadas pela máquina da propaganda nacional. Contudo, muito se irá alterar com a suposta panaceia de Bolonha, que, não melhorando o ensino nem desenvolvendo a ciência, terá certamente o positivo desfecho de poupar ao Estado muitos dos milhões de euros que até agora investia na Educação. Esperemos que as propinas baixem 25% do seu valor actual, porque é nessa percentagem que vai diminuir o tempo de frequência nas licenciaturas.
O grande defeito do actual processo de educação nacional está na estratégia de avaliação das expectativas gerais, que infelizmente se nivela pelos mais baixos índices, o que forçosamente cavará um fosso cada vez maior entre as camadas instruídas e a mediocridade, à qual sobeja mesmo a mais elementar consciência cívica. O problema agudizou-se quando a mediocridade impante se aventurou à conquista dos partidos políticos, infiltrando-se nas chefias para sub-repticiamente empalmar o poder. Aquilo a que chamo a mediocridade aventureira expulsou da senda política e das esferas do poder os homens de bem, os mais instruídos e melhor intencionados, os mais honrados, impolutos e desinteressados das sinecuras da governança.
O exemplo do Ministério da Educação é paradigmático. Instalaram-se nos diversos gabinetes daquele Ministério uma clique de funcionários, especializados em Ciências da Educação e “coisas” afins, de que foi particular exemplo o Prof. Marçal Grilo, que foi quem no último quarto de século timonou a nau educativa da nação portuguesa. Os resultados estão à vista, mas parece que não têm sido os mais animadores. É o que acontece quando se misturam os interesses partidários com os interesses da Nação, e os rasteiros valores da política com a suprema grandeza da Ciência.

A educação auto-sustentada e a instrução popular

Pela experiência acumulada, nos mais de vinte anos que dedico à docência universitária, constato que raros são os alunos que leram integralmente uma obra de Camilo Castelo Branco, de Eça de Queirós, de Vitorino Nemésio ou de Jorge de Sena. Quando muito ouviram falar desses autores ou leram deles alguns textos, breves e parcelares, ficando na total ignorância em relação às suas obras.
Urge pois proceder à alfabetização cultural da nação portuguesa, não só através duma educação auto-sustentada, como principalmente dum programa nacional de instrução das massas laborais, urbanas e rurais. O processo educativo deve contemplar não só os jovens estudantes, como também as classes etárias intermédias ou produtivas. Aos desempregados deverá ser dada prioridade num programa de formação intelectual e de reaprendizagem da vida produtiva. Aos idosos deverá ser franqueada a entrada nas universidades para obterem cursos reais e efectivos, e não apenas a simples ocupação dos tempos livres nas designadas Universidades da Terceira Idade.
É fácil incutir não só nos jovens como nas classes adultas uma educação autodidáctica, estribada na observação e na análise superficial, a qual poderá vir a ser consolidada por um acompanhamento de leituras educativas a preços controlados e acessíveis. O Estado precisa de optar urgentemente por uma política do Livro, que facilite a edição a baixo custo e proporcione o consumo e a popularização da leitura. Daqui resultará uma política de defesa e valorização da língua portuguesa, uma divulgação e fomento da leitura pelo prazer da descoberta autodidáctica dos grandes valores da literatura nacional.
Em paralelo impõe-se uma política de familiarização dos estudantes e da classe média com a música, com a herança etnográfica do nosso património etnomusical, das danças e cantares, dos instrumentos e dos sons. Por outro lado, parece-me implícita a educação da preservação dos valores identificativos, como é o caso do património histórico, arquitectónico, artístico e cultural. A preservação e fruição dessa riqueza nacional não devem ser pertença exclusiva dos mais instruídos, mas antes da população em geral, através de uma política de divulgação e, vamos lá, do incentivo ao orgulho de ser português, na justa proporção do nosso contributo universal e da nossa rudimentar inserção europeia.

A gestão das prioridades

A viabilização deste programa de articulação da Cultura com a Educação deverá ser um dos prioritários objectivos do Estado. A “gestão das prioridades” em que se deve articular essa relação Cultura/Educação é que se tornará no principal papel do Estado, em sintonia com os poderes locais e com as Organizações Não Governamentais. Há, talvez, que voltar a recuperar o que é genuíno – não o que é fundamental – o que é caracteristicamente lusíada e tudo aquilo que constituem valores clássicos do humanismo ocidental, sem contudo marginalizar as vanguardas experimentais que optam por outras vias de criação, não divergente nem contrárias aos interesses gerais. Errado seria ver no vanguardismo a prioridade nacional em nome da livre criação artística e do subsídio-dependentismo, o qual forçosamente resultará em detrimento dos objectivos globais da educação, os quais julgamos que devem embasar numa solidez intelectual construída a partir da leitura dos autores e das obras em que se consubstanciou, ao longo dos séculos, a cultura portuguesa.
É preferível nas idades de formação intelectual ler Bernardim Ribeiro, Camões ou Cesário Verde, do que os poetas e escritores simbolistas, modernistas, surrealistas ou existencialistas, cujo discernimento socio-filosófico só se poderá aquilatar depois de adquirida uma sólida cultura geral. Nessa altura a descoberta dos movimentos vanguardistas tornar-se-à mais positiva e mais inteligível para o leitor, pois que está mais receptivo à aquisição da diferença e da mudança.
Nas escolas é preciso induzir os jovens à leitura sem que isso constitua necessariamente uma obrigação ou um parâmetro de avaliação exclusiva, o qual se deverá basear na liberdade de opção e de auto-análise. O aluno conforme a sua classe etária deverá ler quatro a cinco obras, de prosa ou de poesia por ano, para ir consolidando a sua instrução auto-sustentada. O recurso à memorização dos factos históricos, das regras gramaticais, dos basilares teoremas matemáticos e de certas fórmulas químicas, tem de ser exigido através duma maior responsabilização do aluno. As exigências de trabalho, de sacrifício e de competência, assim como as penalizações e reprovações terão de ser restabelecidas sem receio de atingirem índices elevados, de forma a criarmos novas gerações de excelência e de inquestionável responsabilidade cívica.

A defesa da língua e o combate à iliteracia

A forma pouco polida, descuidada, agressiva e despudorada como se tem usado a língua portuguesa, nomeadamente nos meios de comunicação social, quer por parte dos jornalistas, quer por parte dos artistas, escritores e políticos, é sintoma da nossa crescente iliteracia e da nossa progressiva insuficiência intelectual. Essa imagem de incompetência no elementar uso da linguagem tem contribuído em larga escala para o rebaixamento dos níveis de qualidade e de erudita aplicação da comunicação integrada. Cada vez mais se desvaloriza e se corrompe a língua portuguesa, através da introdução de estrangeirismos e de descabidos neologismos.
O regular ordenamento da expressão oral e, sobretudo, a exigente composição da escrita, contribuirá para o aperfeiçoamento do diálogo, da erudição e da respeitabilidade social. Só através do correcto uso da capacidade de expressão é que se poderá explanar a superioridade do pensamento. Pensa melhor quem traduz melhor, ou seja, as ideias poderão ser tanto ou melhor adquiridas quanto mais esclarecida e cristalina se tornar a comunicação. Para isso urge aperfeiçoar as capacidades de escrita nas classes estudantis. Isso adquire-se e entranha-se através da leitura que melhor se adapta ao seu nível etário e intelectual.
Lembro-me que no passado houve tentativas de popularização da cultura e da instrução através da edição de livros a baixo preço, com um discurso acessível, sintetizado e explícito. Foram disso exemplo a «Colecção Cosmos» e os «Cadernos da Seara Nova». Através deles aprenderam gerações de portugueses sem recursos financeiros para ocuparem os bancos universitários. O esforço de Bento de Jesus Caraça é paradigma desse programa de autodidactismo das classes trabalhadoras. Também por esse caminho fizeram ligeiras incursões alguns espíritos superiores como António Sérgio, Jaime Cortesão, Raul Proença e outros “searistas” ou “presencistas”.
O que acontece actualmente é que os alunos quando chegam às Universidades têem uma propensão natural para o generalismo, pois que assim foram treinados nos anos anteriores, com recurso ao ensino das línguas, da Filosofia, das Humanidades e das Ciências Exactas. O seu intelecto mostra-se disposto a derramar a atenção por várias matérias. Porém, na Universidade é logo conduzido para a focalização científica, para a especialização e para o particularismo. Desse modo contrai-se a sua avidez de aprendizagem, secciona-se e fulcraliza-se a sua formação científica em aspectos exclusivamente relacionados com a sua área de formação. Daí que os cursos das chamadas Ciências Exactas ou das Ciências Experimentais não optem por uma formação mais abrangente, no sentido de acompanharem a acumulação de conhecimentos com a sua integração e explicação no tempo social, no tempo político e no tempo cultural.
O desfasamento entre o ensino secundário e universitário é abissal. Contudo, nota-se hoje uma crescente aproximação do topo para a base. Parece-me que deveria ser ao contrário. Mais grave ainda é o nível cultural das licenciaturas antigas para as novas licenciaturas, que sendo cada vez maior só tem conduzido ao abaixamento da qualidade científica e das exigências de competência profissional. Com a reforma de Bolonha tudo se resumirá à queda da fasquia da qualidade, da exigência e da competência, numa rasoira da sumidade e numa entronização da mediocridade intra-europeia. Quem se vai aproveitar disso é o Reino Unido e os Estados Unidos da América, que assim irão superiorizar-se ao nosso baixo nível científico e à nossa inferior qualidade académica. Dantes era-mos pobres mas cultos, agora vamos continuar a ser pobres, mas cada vez mais ignorantes.

1 comentário:

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