segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

O Mundos dos Rústicos e as justiças populares


 Na sociedade portuguesa do Antigo Regime (que se prolongou até à publicação do primeiro Código Civil português, em 1867, a que o vulgo chamava “Código Seabra”), existiam duas realidades jurídicas distintas. Por um lado, o Direito Erudito, digamos assim, nascido nas universidades e nos tribunais superiores, onde muitas vezes se fazia jurisprudência, pela exigência prática da vida social, cujos executores (os juízes) eram professores universitários em Coimbra, desembargadores da Relação, conselheiros do Desembargo do Paço, em suma, eram advogados, homens letrados e oficiais do Rei.
O juiz de paz, eleito pelo povo
Dito de uma forma mais simples, o chamado Direito Erudito, não era mais do que o Direito das Ordenações, inspirado na tradição histórica, no conhecimento livresco e positivo. No fundo consistia na administração oficial da Justiça, tendo como exemplo mais ilustrativo a figura do Juiz de Fora. Não era eleito, mas antes nomeado pelo Rei, sendo por isso uma autoridade superior. Para realçar a sua autoridade, recebia uma “Vara Branca” (por ser o branco símbolo da pureza e da autoridade régia) e o epíteto de “Juiz de Fora”. O conceito “de fora” significava a imparcialidade e isenção das suas decisões, visto não ter compromissos nem relações de amizade com os moradores (dizia-se vizinhos) da terra onde exercia a justiça. O juiz de fora, era o representante do poder régio, e por isso superintendia a todas as autoridades locais, presidindo às manifestações oficiais do foro civil.
Por sua vez as chamadas justiças locais tinham na figura do Juiz do Povo ou Juiz Ordinário, a personificação mais genuína e tradicional do direito português. Para se distinguir empunhava uma vara vermelha. Já agora, esclareça-se que a “vara”, simbolizava a autoridade e teve origem no “fasces” [o fascio italiano que inspirou o fascismo], que era um bastão usado na antiga Roma pelos magistrados para abrir caminho por entre a multidão que enxameava o fórum. O uso e exibição da vara do “juiz de direito” tornou-se obrigatória a partir do séc. XVI, conforme consta nas «Ordenações Manuelinas», e se confirma no século seguinte no «Código Filipino». Era de madeira pintada e tinha a estatura média de um homem (cerca de 1,60m). Depressa passou a insígnia da justiça, tornando-se num símbolo de respeito pela autoridade superior. Ainda hoje se designa por “vara” a circunscrição em que o magistrado exerce o seu múnus judicial. Nas comarcas onde há mais do que um juiz de Direito, designa-se por “vara” cada uma das divisões da sua jurisdição civil ou criminal. No âmbito dos tribunais modernos, a “vara” traduz diferentes patamares de justiça, que são os órgãos judiciários de primeira instância, dos quais se pode recorrer para uma instância superior.
As varas do poder, juiz e vereador municipal
O Juiz Ordinário, que empunhava a vara vermelha quando presidia às sessões da sua autarquia, quando figurava nas procissões ou noutros actos públicos, tinha o glorioso epíteto de Juiz do Povo. Isso devia-se ao facto de ser sufragado pelos seus iguais, isto é, pela população do concelho. Não era necessariamente um homem letrado, instruído, conhecedor do direito oficial, ou de qualquer outro tipo de jurisprudência. Nem tinha obrigatoriamente de saber ler e escrever. O que verdadeiramente importava, para o bom desempenho do cargo, era o seu carácter, a sua honradez e integridade moral. É claro que só seria eleito quem tivesse pleno conhecimento das tradições locais, que o tempo transformara em leis sociais de procedimento e de conduta. Diga-se em abono da verdade, que raros eram os juízes ordinários analfabetos, sendo na sua generalidade pessoas de avançada idade, lavradores ou proprietários rurais.
Peniche, museu, varas de vereação
A principal característica dos Juízes Populares ou do Povo era a sua eleição – origem social e tradicional do sufrágio electivo, que vinculará o Liberalismo às origens da democracia moderna. O carácter eleitoral deste tipo de justiça, acrescida da sua modesta erudição intelectual, dava aos juízes locais o epíteto de «Direito Rústico», no qual se inseria toda a vida social e tradicional da nossa cultura rural. Daí designar-se por «Mundo dos Rústicos» a sociedade portuguesa do interior, que vivia da terra, dos laços socioeconómicos, religiosos e culturais, inspirados no espírito telúrico da posse, na maternidade do solo e na fertilidade da vida. Terra e vida, eram no passado, conceitos coadjuvantes, senão mesmo equivalentes. Não se trata aqui do valor patrimonial da terra, mas antes no seu valor histórico, no seu prestígio moral e social. Esse espírito da mãe-terra foi dominante na mentalidade medieval europeia, mas perdurou entre nós, mais no interior do que no litoral mercantil, praticamente até ao período da “Regeneração”, iniciado na 2ª metade do séc. XIX, e liderado por Fontes Pereira de Melo.
Em boa verdade, o «Mundo dos Rústicos» era constituído pelo poder local, ou seja, pelo velho municipalismo feudal, no qual se integravam as primordiais comunas rurais, cuja existência seria legitimada e reconhecida pelas autoridades régias, pelos senhores feudais e até pelos conventos (como no caso de Alcobaça) através das cartas de foral. Lembramos que, mercê da outorga da Carta de Foral, as populações de colonos que integravam as velhas comunas, passaram a usufruir dos seus próprios meios de organização e gestão da vida local, quer administrativa quer judicial. As populações que obtivessem carta de foral, passavam a existir de direito e de facto, com demarcação do seu espaço territorial, com autonomia, e sobretudo com direitos e liberdades para decidirem o seu futuro. A carta de foral, tinha como principal característica a confiança que o povo passava a depositar no seu rei, que através desse documento garantia a outorga de terras para usufruto da comunidade, regulando o tributo que deveriam pagar pela sua conservação e defesa militar. O facto de pagarem os impostos consignados no foral, dava-lhes a dignidade de estarem a contribuir para a glória do rei, para a defesa da pátria e para a independência nacional.
Foral de Satão, dado por Afonso Henriques, 1149
É curioso que em muitas dessas cartas de foral se menciona o estabelecimento das justiças locais, em honra das quais se erigia um monumento em forma de pilar, sobre um plinto de três ou mais degraus, encimado por uma coroa ou algo semelhante, erigido em frente da Câmara ou no centro da vila. Era o Pelourinho, símbolo da autonomia municipal, cuja decoração artística e monumentalidade dependia do orgulho histórico e da força económica do concelho. No seu vulgar arquétipo é uma espécie de fuste, ao qual se amarravam os acusados para que ouvissem dos seus juízes a sentença a que deveriam ser condenados. Os crimes desde que não fossem de sangue, eram executados em público sob a forma de açoite (com baraço ou verguinha), no próprio pelourinho.
Pelourinho de Barcelos
O período foraleiro, corresponde de um modo geral, ao processo histórico em que decorre a vigência do “Mundo dos Rústicos”, isto é, entre o século XII e o século XVI. Portanto, desde a formação da nacionalidade dominada ainda pelo espírito medieval, até ao estabelecimento do mercantilismo e à atlantização europeia, o nosso país passou por várias fases ou metamorfoses do foro político, económico, cultural, mental e até religioso, sem nunca descurar a importância do municipalismo na história da formação do espaço nacional. Se existe alguma herança que os portugueses tenham legado às gerações vindouras, essa foi sem dúvida alguma o municipalismo. Se existe, em contraposição, algo de que não nos orgulhamos é do estabelecimento da Inquisição, que a partir do séc. XVI lançou no país uma profunda depressão mental, de que resultaria a desconfiança social, o temor da delação, a desorganização do aparelho produtivo e a lenta afirmação do capitalismo em Portugal. Não se pense, porém, que a validade dos forais cessaria com a afirmação do poder real, pois que o próprio D. Manuel, que se pode considerar como o mais poderoso monarca do seu tempo, a quem certos cronistas chamaram o maior imperador da Europa, reformou o municipalismo através dos «Forais Novos», reconhecendo a autonomia dos concelhos, os seus direitos e liberdades, apenas reformulando os tributos neles consignados. Os forais, por serem atentatórios ao progresso dos sectores económicos e à livre circulação do bens e mercadorias, foram extintos por Mouzinho da Silveira, no período fantoche do «Governo da Terceira», em 1832, entrando em vigor logo após a vitória militar do partido liberal de D. Pedro IV.
Ceifa do trigo numa iluminura do séc. XIV
Foi a partir da fundação dos concelhos e da formalização do aparelho administrativo do reino luso, que nasceu a classe da governança, formada pelos “homens bons” ou “ricos homens”, designações sociais ou categorias políticas, que estiveram na base de formação da chamada fidalguia dos concelhos. A categoria dos homens bons era a mais primordial, e a ela pertenciam aqueles que o povo alçava por seus representantes, para o exercício da justiça e da administração pública. Mais tarde, vão-lhes suceder os ricos homens, mais representativos do materialismo económico que se sobrepôs à tradição, à conservação dos costumes e até à memória histórica.
Família de camponeses rústicos, pobres e ignorantes
A principal característica no chamado «Mundo dos Rústicos», como acabamos de afirmar, estava na eleição das justiças locais, ou Juízes Populares tradição que vigorou quase até ao séc. XIX, ao período da Regeneração. Em contraposição, impõe-se esclarecer que, no final do Antigo Regime, cerca de 35% dos Juízes ao serviço dos tribunais eram do tipo “letrados”. Significa que não eram eleitos pelo povo, mas antes nomeados pelo Rei como Juízes de Fora, para o exercício judicial em regime deambulatório. Lembro que só os crimes de maior gravidade exigiam a presença de juízes letrados. Mas, conforme os concelhos cresciam de população também assim cresciam em número as bancas de advogados, cujos serviços aumentavam o caudal de pendências que inundavam os tribunais. Por isso, se exigia mais e melhor justiça. O direito erudito, exercido por magistrados formados em Coimbra, foi progressivamente desvalorizando o direito local e tradicional. Instalou-se na consciência pública a ideia formal do Juiz Local, do Juiz Popular, eleito pelo povo, ser dominado pela “Ignorantia” e pela “Imperitia”, visto se deixar guiar pelo senso comum, pelos costumes locais, e pela tradição judicial, isto é, pelo conhecimento herdado localmente de anteriores sentenças lavradas sobre casos semelhantes. Com o Renascimento e a laicização do direito, assistiu-se à afirmação do poder régio e ao centralismo administrativo, razão pela qual se alterou o padrão de cultura jurídica, ou seja, o direito local, exercido pelos juízes do povo, cedeu lugar ao direito régio ou direito erudito.
O direito tradicional não tem escola, é fruto da experiência vivencial e do senso comum. Por isso, foi sempre transmitido por via oral, desde tempos imemoriais, e por sucessivas gerações. Daí surgiu a consciência de que o direito local era a alma e essência do “mundo dos rústicos”. E quem eram os “rústicos”? Desde os primórdios da Idade Média, que os colonizadores visigodos definiam os rústicos como sendo aqueles que viviam fora dos burgos, isto é, fora das localidades urbanas. A falta de convívio social e de mobilidade geográfica fez com que essas gentes cristalizassem no tempo, amorrinhassem as ideias, e freassem a vontade de descobrir a verdade das coisas e os porquês da realidade. Havia nisto uma espécie de conflito de interesses entre o empirismo e o racionalismo positivista.
Em suma, o rústico era o camponês, que vivia em absoluta dependência da terra e dos elementos naturais. Não admira, por isso, que as características peculiares do rústico fossem a ignorância e a rudeza. Ora se as autoridades administrativas e judiciais dos concelhos dependiam do sufrágio deste tipo de pessoas, facilmente se compreende que o mundo dos rústicos era o palco privilegiado da insciência, da aspereza e da incivilidade. A figura do Juiz do Povo, herança histórica do município romano, depressa perdeu prestígio e credibilidade nas cidades e na corte régia.
O Bom e o Mau juiz, fresco do tribunal de Monsaraz
Os Juízes Ordinários, ou juízes do povo, tinham uma característica única e peculiar: eram eleitos e representavam a vontade e a empatia do povo. Esta particularidade colocava-os, desde logo, em sintonia com o pulsar da vida local, com o sentimento de pertença ao concelho donde eram naturais, granjeando, por isso, forte popularidade e sólida confiança junto do povo. O carácter electivo deste padrão de justiça, que remontava ao antigo direito romano, acrescida da sua parca ilustração e da sua falta de cortesia social, dava aos juízes locais o epíteto de “Direito Rústico”. Era nesse âmbito, nesse tipo de vida encasulada em que subsistia a sociedade rural, esquecida, excluída e às vezes marginalizada pelo centralismo político da Coroa, que se inseria e desenrolava o ronceiro e pacato “Mundo dos Rústicos”. No fundo estamos em presença da velha dicotomia, antagónica e inconciliável, entre o Campo e a Cidade, entre a vida rural (indolente, desinteressada e conservadora) e a vida urbana (apressada, ambiciosa e progressiva), que cede lentamente o passo, à economia burguesa, à manufactura, ao mercantilismo e à fragmentação da antiga sociedade portuguesa.
Perante a especificidade cultural do mundo dos rústicos, tornava-se impraticável o direito erudito nas localidades do interior. Nas vilas rurais, onde a autoridade régia mandava exercer a justiça erudita, era óbvio o choque de mentalidades e a desconfiança dos campesinos face ao desfecho das suas pendências. Dizia-se que o povo desconfiava dos acórdãos lavrados pelo Juiz de Vara Branca ou Juiz de Fora, por duvidar da sua imparcialidade. Este apresentava-se nas vilas e cidades rurais com a soberba do representante do poder régio, pelo qual era aliás estipendiado. Para além de ser estranho à comunidade também não convivia ou participava na vida social, e quando saía fazia-se acompanhar pelo meirinho, não só para sua segurança pessoal como também para vincar, de forma acintosa, a ameaça da sua presença. Ninguém gostava do Juiz de Fora. Essa era uma verdade incontornável. A sua impopularidade recrudescia no ódio local quando, por vezes, tomava certas medidas de forma repentina e excessiva, o que lhe outorgava a imagem de autoridade discricionária, quase tirânica. O juiz da vara branca era uma figura intocável, uma força quase divina. E por concitar em si a representação régia, significava o poder do centro que sempre repugnou à periferia. Daí que a figura do Juiz de Fora bem cedo se tornasse numa indesejável intromissão na vida dos rústicos.
Foral novo de D.Manuel I, sec. XVI
A atitude mais condigna do juiz erudito, para com as sociedades rústicas, era a da condescendência, face à ignorância e boçalidade dos juízes populares. No entanto, em vez de procederem com tolerância e compreensão, optavam por um arrogante desprezo pela falta de ilustração e modestas origens dos magistrados locais. Na perspectiva erudita a situação resumia-se assim:
«O rústico era, por um lado, a criatura franca, ingénua, incapaz de malícia, desprovida de capacidade de avaliação exacta das coisas em termos económicos e, por isso, susceptível de ser enganada. Por outro lado, porém, era o ignorante e o grosseiro, o ser incapaz de se exprimir correctamente e de compreender as subtilezas da vida, nomeadamente da vida jurídica. Por fim, ele era o pobre cujas causas nunca atingiam uma importância que justificasse as formalidades solenes dum julgamento». [A. M. Hespanha, «Sábios e Rústicos: a violência doce da Razão Jurídica», in Revista Crítica de Ciências Sociais, nº 25/26, Dez. 1988, Coimbra, Centro de Estudos Sociais, 1988, pp. 42]
Aos Corregedores, na sua qualidade de inspectores das justiças locais, competia-lhes instruir os magistrados populares na arte de julgar, o que com o decorrer do tempo veio trazer o direito erudito para os tribunais locais. Contudo o maior obstáculo a essa lenta progressão residia na ignorância e insuficiente ilustração dos magistrados. Não era raro que até fossem analfabetos. Aliás, as Ordenações não exigiam que os juízes locais soubessem ler e escrever. O Prof. António Hespanha define o Juiz nos seguintes termos:
«O Juiz é por essência um oficial da comunidade com a função de resolver os conflitos, de acordo com as normas que ele próprio para si estabeleceu, e não o delegado de um poder heterónomo e superior como o rei» [op. Cit., p. 47].
Para o desempenho do cargo de juiz local, cujo principal atributo e legitimidade era o de ser eleito pelos moradores do concelho, exigia-se a posse das seguintes qualidades: bondade, justa consciência, prudência e diligência, ao passo que a eloquência e a perícia eram qualidades secundárias e minimamente requeridas. No mundo dos rústicos, o juiz local ou ordinário, como lídimo representante do povo, tinha um poder e um prestígio difícil de superar, a não ser pelo seu opositor judicial: o Juiz de Fora. O primeiro representava o povo, as tradições autóctones, os usos e costumes, as liberdades e garantias consignadas na Carta de Foral, uma espécie de carta de alforria do concelho. O segundo representava o poder do centro contra a periferia, a autoridade régia, a imposição da lei, concebida e fundamentada em princípios políticos, em resoluções arbitrárias, culturalmente estranhas e desajustadas às tradições, usos e costumes dos povos.
A sociedade privilegiada no tempo de D. João V
O magistrado régio, conhecido e oficialmente designado como Juiz de Fora, era um togado da Coroa que executava a lei em primeira instância, cujas sentenças caso não fossem do acordo dos povos poderia ser dirimida em última instância no tribunal régio de apelação, que se designava por Desembargo do Paço. Os juízes de fora, surgiram pela primeira vez na organização judicial do reino, na segunda metade do século XIV. Na centúria seguinte estenderam a execução imparcial e positiva da lei a todo o reino. Em algumas regiões, mais pobres do interior ou de difícil acesso, os concelhos não tinham condições económicas para garantir a aposentadoria do Juiz de Fora, isto é, não lhes podiam ceder habitação nem casa de justiça, pelo que os magistrados visitavam essas terras nos meses de primavera-verão por serem mais convenientes ao seu deslocamento, abrindo as audiências nas casas do concelho, no adro da igreja ou no rossio da vila.
Com o decorrer do tempo, criou-se a figura do Corregedor, cuja autoridade era intermédia, ou seja, era superior ao juiz local, mas inferior ao juiz de fora. No fundo o Corregedor era um oficial de justiça encarregado de inspecionar as justiças locais.
Em breves pinceladas, tentamos esboçar o “Mundo dos Rústicos” nos seus mais variados aspectos, históricos, sociológicos e jurídicos, lembrando a quem nos lê que a vida, desde a era medieval que assistiu à formação da nação lusíada, passando pelo renascimento que inspirou as descobertas atlânticas, a diáspora e a portugalidade, o Antigo Regime e a colonização, o liberalismo e as ideias democráticas, que inspiraram a República – em todos esses momentos o nosso país viveu a duas velocidade e sob o domínio de dois diferentes mundos: o dos urbanos, na faixa litoral operando uma economia de mercado, e o dos rústicos no interior continental, subjugados à dependência agrária, às tradições sociais, e às crenças religiosas.

sábado, 18 de janeiro de 2020

Um ciclópico falo algarvio glorificado por Guerra Junqueiro


O poeta Guerra Junqueiro, que fez parte dos «Vencidos da Vida» ao lado de Eça de Queirós e de Ramalho Ortigão, que foi um indomável republicano, revolucionário fervoroso, céptico e anticlerical, autor de várias obras primas da lírica contemporânea – escreveu nos tempos de jovem deputado por Macedo de Cavaleiros, um poema jocoso, a que chamou filho do álcool e da boémia. Arrependeu-se cedo de o ter feito, mas não a tempo de impedir que algum dos seus amigos, não sei se por brincadeira ou maldade, o publicasse num quarto de papel, de forma clandestina e não autorizada. O poema em si é bem-humorado, tem graça e suscita a gargalhada no mais sisudo leitor.
O poeta Guerra Junqueiro
Esse raríssimo folheto, editado em segredo, tinha por título «A Torre de Babel ou a Porra do Soriano», e segundo creio teve uma edição de apenas 40 exemplares. O poeta Guerra Junqueiro não achou que a divulgação favorecesse o seu bom nome, e por isso tratou de dar caça ao panfleto que certa mão negra dera à estampa. Ocupou-se nisso quase toda a vida, e parece que lhe deu eficaz extermínio. Todavia nunca se apercebeu da traição que um dos seus amigos lhe aprontou, ao reservar uma cópia para posteriores edições. O seu amigo Raúl Brandão relatou o episódio no 2º volume das suas Memórias: «Junqueiro escreveu algumas poesias eróticas, que um livreiro do Porto a ocultas coligiu e publicou tirando quarenta exemplares». E mais adiante acrescenta: «José Sampaio [Bruno] arranjou um para a Biblioteca Municipal do Porto. Junqueiro que passou a vida a comprar por todo o preço esses exemplares, deu o manuscrito da Pátria à Câmara do Porto em troca do exemplar da Biblioteca. E dizia: - Esses versos não são meus, são do álcool.»
Todavia, o conhecido escritor João Paulo Freire (Mário), publicou em «Curiosidades Bibliográficas» o seguinte acrescento: «Sampaio Bruno aceitou e mandou fechar a sete chaves uma cópia que mandara tirar do original que Junqueiro acabava de inutilizar. Desta edição tiraram-se apenas 60 exemplares».
Concluiu-se, portanto, que foram feitas novas edições, com datas apócrifas e, como facilmente se constata, com um título diferente: «Pedro Soriano». Porém, nunca lhes passou pela cabeça, nem do poeta nem do “Bruno da Biblioteca” que o jocoso poema chegasse ao Brasil, onde não foi depurado do conhecimento público. Julgo que em 1981 vi esse exemplar, que se dizia ser o único da edição prínceps, disputado em leilão por alguns dos mais insignes bibliófilos nortenhos, cujo arrematante deixou na mesa do pregão um cheque de sessenta contos.
Capa da edição apócrifa do Porto

Há alguns anos, vi uma edição considerada erradamente original, que se apresentava como impressa em Paris, e tinha a data de 2119. É claro que essa data fazia parte da laracha que envolvia a própria edição, apócrifa do Porto. Esse opúsculo, tipo in-fólio, já que tinha apenas 14 páginas, nas dimensões de 11,5x16,5 cm, estava impresso em papel linho, com uma capa cinzenta e o título, «Pedro Soriano», impresso a vermelho, com uma vinheta floral ao meio. Um olhar experiente e conhecedor vê logo que aquilo tinha saído de um prelo antigo e desgastado, à maneira imagem dos pasquins que os republicanos davam à estampa nas tipografias clandestinas.
Qual não foi o meu espanto quando vi, agora, há dias, num outro leilão, realizado em Lisboa, um folheto do célebre poema obsceno de Junqueiro, numa edição impressa na Typographia de José F. Ferreira, em Lisboa, datada de 1882!!! Dizia que era edição original e raríssima. Por isso foi arrematado por 110 euros.
Por conseguinte, existem no mínimo duas edições do poema licencioso de Junqueiro, ambas clandestinas e com o mesmo título, Pedro Soriano, presumivelmente editadas na década de oitenta do século dezanove, que escaparam ao conhecimento e à sanha exterminadora do poeta.
Apesar de Junqueiro tentar apagar aquela excrescência literária, de exaltação a outra excrescência, física, não logrou extirpar o furúnculo poético que é hoje mais procurado e raro do que a edição monumental de A Velhice do Padre Eterno, editado em 1885.
Na parte que me toca, interessa referir que na origem deste poema está um algarvio, de facto chamado Pedro Soriano, que no decorrer da sua vida aventurosa e atribulada cometeu alguns erros, mas também algumas virtudes, de que hoje já nem reza a história. Não vou falar desse pobre diabo, que para fugir à justiça e procurar uma nova oportunidade de vida teve de emigrar para a América, onde alcançou sucesso, foi feliz e morreu como um justo. Nas terras do tio Sam dedicou-se curiosamente às letras e granjeou prestígio como jornalista. Conheço dele dezenas de crónicas que publicou nos jornais portugueses, naquelas secções de correspondência do exterior, a que chamavam «Cartas da América». Não vou agora falar dele. Fica para a próxima.
Capa da edição comercial do poema
O que importa agora é dizer que o tal Pedro Soriano, tornou-se alvo da verve poética do Junqueiro porque, segundo lhe diziam os amigos, possuía um membro viril de tão grandes proporções que causava a cobiça aos mais galantes Casanovas da capital, que ao lado desse garanhão descomunal não passavam de níveos querubins de sacristia. Quando os amigos do Pedro Soriano, muitos deles algarvios, como o famoso Lorjó Tavares, todos com largo cadastro de pândegos, e réus encartados de flostrias e distúrbios da ordem pública – razão pela qual em Faro designavam o grupo por «Sociedade dos Terríveis» – o obrigaram a descer as calças e mostrar a ciclópica “tromba” ao poeta da «Musa em Férias», escancarou-se-lhe a boca de espanto, e acicatou-se-lhe o estro para borcar uns versos mais ordinários que os tafuis da Mouraria.
Na capa do famoso opúsculo, editado em 1882, narra-se o episódio nos seguintes termos:
«Pedro Soriano foi o heroi de um casamento simulado que houve em Lisboa. Tinha o membro viril desenvolvidíssimo. Uns amigos de Junqueiro, encarregaram-se de lhe apresentar o Soriano, porque tendo contado a Junqueiro a enormidade do membro, ele dissera que exageravam. Junqueiro viu e exclamou: “Tamanho membro merece um poema”.»
E escreveu-o, mas de tal maneira ordinário, indecoroso e obsceno, que anos mais tarde, após ter alcançado o êxito e a glória, com «A Velhice do Padre Eterno» (1885), com o «Finis Patriae» (1890), «Os Simples» (1892) e a «Pátria» (1915), lembrou-se já Ministro Plenipotenciário da República, que deixara no passado um rasto de indecência poética que urgia apagar da posteridade. Foi o que fez, quase até ao fim da vida. Mas quando pensava ter-se livrado desse escabroso apêndice poético, eis que os seus adversários políticos encontram no Brasil um exemplar, que reeditam, salvando da obscuridade uma composição poética que Guerra Junqueiro ditou de improviso, quiçá inspirado na verborreia bocagiana.
O poeta Abílio Manuel Guerra Junqueiro
Dizem alguns dos que privaram com Junqueiro, que ele já conhecia o femeeiro algarvio e que se divertira imenso com a tal diatribe do seu falso casamento. Acrescentam até que terá escrito este licencioso poema por causa do escandaloso conúbio. Na verdade, a imprensa da época falou muito no “caso de Torres Novas”, em que o Pedro Soriano encenou um sacrílego matrimónio com uma jovem inocente, de nome Maria Eugénia, que depois de com ele viver largo tempo, abandonou o lar e escapou-se para Lisboa. O estouvado Soriano, perdido de amor e de ciúmes, foi-lhe no encalce, e tentou resgatá-la de volta ao lar. Mas ela queixou-se às autoridades de ter sido não só enganada como “arrombada” pelo descomunal membro viril do seu falso marido.
Apesar da chacota e do escândalo, o Pedro Soriano foi preso e condenado em 1881, por ter simulado um casamento religioso com uma jovem inocente, com o objectivo de desfrutar as núpcias de forma ilícita. Note-se que os casos de duplo casamento não eram raros naquele tempo, se bem que constituíssem grave crime. Mas este foi muito pior, porque inventaram a cerimónia de casamento, para brincarem com a situação e desfeitearem a jovem, lançando-a à mercê do “Mastro do Leviathan”. Depois que a marosca foi descoberta e denunciada, o malandro do Pedro Soriano foi detido, fechado em grades e condenado a degredo. Fugiu mais tarde para os Estados Unidos da América, de onde não mais regressou à pátria.

* ... * ... * ... * ... *

 O poema licencioso, que na versão original saiu a pública sob o título «A Torre de Babel ou A Porra do Soriano», e para que os nossos leitores possam aquilatar, no seu vernáculo, o jaez pouco recomendado para época, deixamo-lo aqui transcrito na íntegra, pedindo desde já desculpa pelo excessos de linguagem que o mesmo contém. Pelo texto se verá que o poeta Guerra Junqueiro, mesmo que toldado pelo álcool, que como ele afirma, terá sido o principal obreiro desta versalhada, não deixa de evidenciar o seu talento, entre um humor, livre e desbragado, e um cepticismo religioso aferrado num incontido anticlericalismo. Nos seus versos ressumam palavras de excessiva licenciosidade, sem as quais, é certo, o poema perderia toda a graça e bom humor. Nota-se um estilo bocagiano difícil de esconder ao leitor. Para melhor leitura adaptei as palavras à ortografia actual. Ouçamos então o dito poema, dedicado ao algarvio Pedro Sebastião de Almeida Soriano, natural de Albufeira, que segundo diziam os amigos, estava equipado com um apêndice sexual de inusitadas proporções, causadoras da maior inveja aos que com ele acamaradavam. 

Eu canto do Soriano o singular mangalho!
Empresa colossal ! Ciclópico trabalho !
     Para o cantar inteiro e o cantar bem
precisava viver como Matusalém.
     Dez séculos !
                         Enfim, nesta pobreza métrica
cantemos essa porra, porra quilométrica,
donde pendem os colhões de que dão ideia vaga
as nádegas brutais do Arcebispo de Braga.


Sim, cantemos a porra, o caralho iracundo
que, antes de nervo cru, já foi eixo do Mundo !
     Mastro do Leviathan ! Eminência revel !
     Estando murcho foi a Torre de Babel !
     Caralho singular ! É contemplá-lo
                                                    É vê-lo
teso ! Atravessaria o quê ?
                                      O Sete-Estrelo !!
Em Tebas, em Paris, em Lagos, em Gomorra
juro que ninguém viu tão formidável porra !
     É uma porra, arquiporra !
                                                    É um caralhão atroz
que se lhe podem dar trinta ou quarenta nós
e, ainda assim, fica o caralho preciso
para foder, da Terra, Eva no Paraíso !!
     É uma porra infinita, é um caralho insonte
que nas roscas outrora estrangulou Le Comte.


Oh caralho imortal ! Glória destes lusos !
Tu poderias suprir todos os parafusos
que espremem com vigor os cachos do Alto Douro !
Onde há um abismo, onde há um sorvedouro
que assim possa conter esta porra do diabo ??!
     Marquês de Valadas em vão mostra o rabo,
em vão mostra o fundo o pavoroso Oceano !
     - Nada, nada contém a porra do Soriano !!


Quando morrer, Senhor, que extraordinária cova,
que bainha, meu Deus, para esta porra nova,
esta porra infeliz, esta porra precita,
judia errante atrás duma crica infinita ??
     - Uma fenda do globo, um sorvedouro ignoto
que lhe há-de abrir talvez um dia um terramoto
para que desagúe, esta porra medonha,
em grossos borbotões de clerical langonha !!!


A porra do Soriano é um infinito assunto !
Se ela está em Lisboa ou em Coimbra, pergunto ?
     Onde é que começa ?
                                    Onde é que termina
essa porra, que estando em Braga, está na China,
porra que corre mais que o próprio pensamento,
porque é porra de pardal e porra de jumento ??
     Porra !
               Mil vezes porra !
                                       Porra de bruto
que é capaz de foder o Cosmos num minuto !!!

terça-feira, 14 de janeiro de 2020

Faleceu o historiador francês Jean Delumeau

Jean Delumeau no seu gabinete de trabalho

Morreu, ontem dia 13 de Janeiro de 2020, o historiador francês Jean Delumeau, um medievalista consagrado que dedicou a maior parte da sua vida ao estudo das religiões, e às relações da Europa com o Oriente. O cristianismo foi o principal tema da sua análise, como historiador, não se poupando a elogios nem a críticas, que por vezes, quando falou da inquisição, foram muito severas.
Jean Delumeau teve um lugar merecidamente preponderante na historiografia francesa, e os seus livros constituem verdadeiros monumentos de erudição, rigor e objectividade no estudo do cristianismo e da cultura ocidental no mundo.

Tinha 96 anos de idade, nasceu a 18 de Junho de 1923, no seio de uma família pequeno-burguesa, em Nantes, onde estudou num colégio religioso da ordem Salesiana, de onde seguiu para a Universidade. Foi um dos mais brilhantes alunos da sua geração. Manteve-se coerente e nunca renunciou às suas convicções.
Era um dos últimos sobreviventes da escola dos «Annales d'histoire économique et sociale», revista fundada pelo imortal Marc Bloch, do qual foram também discípulos Lucien Febvre e Fernand Braudel. À escola dos «Annales» sucedeu nos anos setenta a chamada «Nouvelle Histoire» de Jacques Le Goff e Georges Duby, da qual descem praticamente todos os historiadores da minha geração. Inclusivamente tive alguns professores, na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, que se repartiam em simpatia, ora por uma ora por outra, dessas escolas. Lembro-me do Prof. Magalhães Godinho dizer que era o principal herdeiro da escola dos «Annales» em Portugal, em compita com o Prof. Borges de Macedo, que foi meu orientador de tese. Como defensores da mesma escola tive o Prof. Barradas de Carvalho, o Borges Coelho e o José Tengarrinha, enquanto o João Medina, que era dos mais brilhantes professores que tive na FLL, já se autorreconhecia como fiel seguidor da «Nouvelle Histoire».
Tenho alguns livros de Delumeau em francês, e em português, um deles bastante antigo, do meu tempo de estudante, sobre a Idade Média, publicado na colecção «Saber», que era uma reposição da francesa com o mesmo nome, que o saudoso Lyon de Castro teve a ousadia de editar no nosso país.
Curvo-me perante a memória desse grande historiador, que está directamente ligado à minha formação científica, cuja perda deixará na historiografia do cristianismo e da cultura ocidental uma marca indelével e uma posição insubstituível.

quarta-feira, 1 de janeiro de 2020

Agricultura, valor e conceito no Antigo Regime

As colheitas, iluminura medieval
A terra, enquanto bem e rendimento, esteve sempre exposta e indefesa, ao sabor dos ventos políticos, das estruturas económicas e da concorrência dos mercados. Mas, ao cabo e ao resto, o que sempre se teve na consideração de verdadeiro e imutável foi a primazia, generosidade, afeição e imortalidade da agricultura, como expressão natural e garantia de permanência do homem à face da terra. A ligação, ou melhor, a umbilical dependência do homem com a terra, criou fortes laços de identificação com a natureza e o meio ambiente que lhe está adstrito. Não resistimos à tentação de aqui transcrever uma definição deste objecto, pela mão de um pensador anónimo, que mais não traduz do que o sentimento político económico do novo espírito fisiocrático, que anunciava a aurora liberal:
«A terra he depozitaria de todas as matérias não somente proprias para satisfazer as necessidades fisicas, a que os homens são pella sua natureza sujeitos, mas tãobem daquellas que a Commodidade e o Luxo inventarão, e a Agricultura he a Arte e o meio para se procurarem todas estas materias». E logo o nosso desconhecido «economista» avança para a definição do objecto da Agricultura: «(...) o seu effeito he dar occupação a huma parte dos homens de cada Paiz; e a sua perfeição consiste em prover a maior quantidade possível das materias proprias para satisfazer as necessidades dos homens reaes ou de oppinião». Mas não deixa de elucidar que a produção agrícola deve estar em consonância com o comércio, servindo de pedra angular na animação do próprio mercado. Porém, reserva ao Estado a obrigação de não só apoiar as culturas locais como, sobretudo, de incentivar as produções de maior interesse nacional, que, aliás, enuncia: trigo, frutas, gados, bosques, ferro, couros, lãs, azeites, linho, vinhos e seda. Precisamente por esta ordem, misturando a agricultura com a silvicultura ou a pastorícia com a indústria, como se tudo fosse comum e acostumado ao lavor das gentes.  Logicamente, a conjugação dos dois sectores (agrícola e industrial) constituiria a chave que abriria as portas do sucesso económico. Atente-se mais uma vez nas suas palavras: «Os povos que tem unicamente contemplado a cultura das terras relativamente á propria subsistencia, tem sempre vivido no receio de Carestias; e o que mais he elles a tem frequentissimamente experimentado: mas aquelles Povos que tem considerado a dita cultura como hum objecto de Commercio tem gozado de huma abundancia assaz copioza e inconstante para o proprio sustento e para suprir com o sobejo as necessidades de outros Povos».[1]
A ceifa do trigo, pintura inglesa do século XIX
Não obstante todos os valores sentimentais de que se reveste o assunto, não se pode, nunca, perder de vista o sentido económico da agricultura, a imponderabilidade dos elementos naturais e o árduo esforço, quantas vezes inglório, do trabalhador agrícola. É, principalmente, nesse sentido, de rendimento, valor e lucro que temos de encarar o problema. Quer na óptica do Estado, quer nos interesses do proprietário, o que sempre esteve em jogo foi o aumento da produção, o abastecimento dos mercados e o preço dos géneros, tudo isto girando numa «equilibrada» esfera de valias e conveniências.
Estamos, por conseguinte, frente à evolução natural das coisas, pela conjugação do factor tempo com o aumento dos contactos e conhecimentos entre os povos, do que resultou uma melhor resposta para a satisfação das necessidades e um substancial incremento dos seus rendimentos, mercê da abertura de novos mercados. O aumento das populações fez disparar o consumo e com isto forçar a passagem de uma agricultura de subsistência para uma agricultura «comercial» ou de mercado.

[1] B.N.L., Reservados, códice 11260, «Notícia Geral do Commercio», fls. 8vº-9.