Comemorou-se no passado dia 21 de Março o Dia Mundial da Poesia, a par da Primavera, que anuncia o ciclo da regeneração da vida, no brilho do sol, no perfume das flores, e de todas as evidências naturais da esperança, do amor e da fertilidade. São esses, os temas positivos, que mais inspiraram a criação poética. E nós, portugueses, somos um povo de poetas, marcados pelo orgulho da independência e pela glória espiritual da nossa identidade. Soubemos erigir uma pátria, e foi pelo destemor da vontade e da coragem que logramos definir o exíguo quadrilátero a que demos o nome de Portugal. Fomos e continuamos a ser a mais antiga nação da Europa, com nove séculos de existência, mantendo sempre a mesma língua, o mesmo território, a mesma religião e o mesmo povo. Numa época trágica, como a que vivemos hoje, não é um vírus que nos vai abater nem calar, mas antes a falta de coragem, de orgulho, de valentia e de consciência nacional, para nos mantermos unidos e não deixar subjugar aos interesses materiais, o supremo valor espiritual da pátria, erguida com o sangue, as lágrimas e a vida dos nossos egrégios avós. É assim que reza o nosso hino, porque foi assim que se moldou no barro da História, a alma e a estirpe do povo lusíada, disseminado pelos diversos quadrantes geográficos da Humanidade.Nesse lindo dia de sol primaveril, Dia Mundial da Poesia, deste esperançoso ano de 2021, não posso deixar de evocar os Poetas Vivos, porque dos nossos amados vates do passado, todos os dias são de poesia e de saudade. Hoje é dia de reverente homenagem, e de suprema gratidão, para com todos os que entre nós continuam a criar pelo brilho diamantino palavra poética, o cenário idílico da vida, a fantasia do amor e a quimera da felicidade social, que os filósofos e os sábios da humanidade sonharam um dia poder realizar.
Os poetas Tito Olivio, Quina Faleiro e Ferradeira Brito |
Hoje quero homenagear os poetas do Algarve, humildes e ignorados, que vivem no remanso da província, sem que as luzes da ribalta se lembrem que eles existem. São tantos que corro o risco de deixar algum para trás de forma injusta e involuntária. Por isso, a todos abraço num fraterno amplexo, dirigido a um só desses talentosos e geniais poetas, que todos respeitam e admiram. Refiro-me ao poeta Tito Olívio Henriques, cuja obra é um marco indelével na poesia portuguesa contemporânea.
Ser poeta é dedicar-se aos outros
O seu talento é muito diversificado, não só no campo da engenharia civil, como na engenharia hidráulica, e até na sociologia, tendo realizado obra material e produção científica, nessas áreas em que desenvolveu a sua actividade profissional. Todavia, o que mais importa realçar na sua já longa existência de quase 90 anos de idade - que completa daqui a dois dias, no próximo 23 de Março -, é a sua dedicação, graciosa e prestativa, aos mais desvalidos e carenciados, alvo preferencial do seu auxílio material e afectivo. Só para termos uma ideia da sua dedicação à sociedade farense, no âmbito do auxílio mútuo, da saúde, da cultura, do desporto, da caridade e até da política, começaremos por ordenar os cargos que exerceu como Presidente: do Sporting Club Farense, da Comissão Municipal de Arte e Arqueologia da C.M.F., da Comissão Administrativa do Sport Faro e Benfica, da Associação de Xadrez de Faro, da Comissão Distrital dos Serviços à Comunidade do Distrito Rotário 1961, e do Rotary Club de Faro (por diversas vezes). Além disso foi Mesário da Santa Casa da Misericórdia de Faro, Vereador da Câmara Municipal, Vice-presidente do Cine-Clube, Secretário da Comissão Distrital de Árbitros de Faro, da Comissão Instaladora do Conservatório Regional do Algarve, técnico responsável pelas obras de restauro do Teatro Lethes, técnico-voluntário do Refúgio Aboim Ascensão, etc. Para não enfadar o leitor, omiti mais de uma dezena de funções prestadas ao serviço da comunidade e do bem comum. Mas não posso deixar de salientar a sua dedicação à delegação de Faro da Cruz Vermelha Portuguesa, de que foi secretário-geral durante vários anos, ao Instituto D. Francisco Gomes, vulgo Casa dos Rapazes, aos Bombeiros Voluntários de Faro de que foi Presidente da Direcção, e ao Conservatório Regional do Algarve - Maria Campina, de que foi Secretário-Geral. Em nenhuma destas instituições auferiu qualquer remuneração, o que é raro acontecer nos tempos que correm.
Glória Marreiros e Tito Olívio, dois expoentes da poesia algarvia |
Jornalista, escritor e editor
Na parte que mais directamente se relaciona comigo, posso dizer que o engº Tito Olívio Henriques prestou um serviço inestimável à cultura algarvia. Desde logo porque há mais de cinquenta anos que colabora na imprensa regional algarvia, com artigos em prosa de intervenção cívica. E depois, como dirigente associativo, primeiro da AIRA, da ASORGAL, e, por fim, como Presidente da Assembleia-geral da Associação dos Jornalistas e Escritores do Algarve (AJEA), e como subdirector do «Jornal Escrito» e da revista «Stilus», onde se deram a público importantes trabalhos sobre a história, a etnografia, a economia, a arte e a literatura algarvia. Fundou também a «Tertúlia Hélice», através da qual organizou diversos recitais de poesia em todo o Algarve.
Além da sua dedicação ao serviço social, o poeta Tito Olívio soube evidenciar o seu talento nas diversas áreas da cultura, nomeadamente na arte, participando em exposições de pintura e escultura, e na literatura, colaborando em jornais regionais, e publicando livros. Para isso, fundou a colecção «Cadernos de Santa Maria», integrada na «AJEA Edições», destinada a publicar obras de curta dimensão da autoria de diversos poetas e escritores algarvios.
Tito Olívio e Rocha Gomes, dois grandes poetas e amigos |
Falar de alguém com a dimensão intelectual do poeta Tito Olívio é sempre difícil de resumir em breves palavras, razão pela qual me alonguei talvez mais do que a natural paciência do meu leitor. Peço desculpa a quem me lê, mas também ao homenageado, pela minha falta de recursos para poder enaltecer as qualidades e o supremo valor do seu talento literário.
Por isso, encerro este breve apontamento lembrando que a sua obra literária e iniciou em 1963, há quase meio século, com a edição do seu livro O Romance do Homem Solitário, uma colectânea de contos, cuja leitura nos deixa surpreendidos pela forma estilística como supera e transcende o neorrealismo, tão em voga e no agrado político da sua geração literária.
Em jeito de remate final, apresento ao poeta Tito Olívio, cuja vitalidade e genica, tem sido um dos seus mais invejáveis predicados, os meus sinceros votos de muita saúde e de felicidade para os desafios que se irão suceder às 90 primaveras que acabou de completar no passado dia 23 de Março.
Tertúlia Hélice num encontro de poetas em Ayamonte |
Bem hajas, amigo Tito Olívio, por tudo o que nos destes e nos ensinastes. Brindei ao teu aniversário, e à distância de um telefonema, porque não te pude abraçar no dia em que certamente mais desejarias ter os amigos por perto. Esta maldita pandemia, e o consequente confinamento a que nos tem sujeitado, consegue-nos separar fisicamente, mas não nos consegue silenciar, e muito menos impedir de te dizer, urbi et orbi, que te admiro muito e que, em qualquer circunstância, estarei sempre ao teu lado.
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