No início da I Guerra Mundial, decorrida entre 1914 e 1918, assistiu-se em toda a Europa a uma forte valorização dos metais, utilizados na indústria bélica. Quando, em 1916, Portugal entrou no conflito, notou-se uma grave escassez de moeda circulante, que se agravou até meados da década de vinte. As moedas de prata e bronze foram logo resgatadas pelo Estado, cujas finanças entraram em insolvência. As de cobre, ferro e cuproníquel, ainda em circulação, foram desviadas para a indústria e fabrico de armas, a ponto de deixarem de existir meios de troca.
Em reflexo da guerra desencadeou-se um surto inflacionário devastador, descaradamente visível nos géneros de primeira necessidade, e sobretudo no aumento do preço dos metais. Por isso, emitir moeda ficava não só muito caro, como era de todo inviável.
Face às circunstâncias, o governo recorreu a uma estratégia que havia sido aplicada em 1891, numa crise financeira muito semelhante – isto é, à emissão pela Casa da Moeda de pequenos bilhetes popularmente designados por “dinheiro de trocos”. Esses exemplares, impressos em papel comum ou em cartolina fina, uns muito simples, apenas com a indicação do local e do valor; outros mais elaborados, por vezes com requintes estéticos – divulgando os heróis locais ou as suas belezas turísticas, num requinte de indisfarçável nacionalismo – ficaram conhecidos até hoje como “cédulas fiduciárias”. Este fenómeno, da escassez de metais amoedáveis foi transversal a toda a Europa. E tal como no nosso país emitiram-se cédulas para facilitar as transacções de baixo valor no pequeno comércio, ficando conhecidas como “monnaies de necessite” em França, “emergency Money”, no Reino Unido, e “notgeld” nas nações do trato germânico.
Para obstar à escassez de moeda, o governo autorizou a Casa da Moeda, alguns bancos regionais, as Misericórdias, as Associações Comerciais, e sobretudo as autarquias (Câmaras e Juntas de Freguesia) a emitirem senhas ou cédulas ou papéis de trocos, abrindo-se uma espécie de cascata nacional que jorrou espécimes monetários no valor de 1 até 20 centavos. Este fluxo fiduciário iniciou-se em 1917 e prolongou-se até 1924-25.
O governo mandou a Casa da Moeda emitir cédulas de 2 e 10 centavos, autorizando a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa a imprimir cédulas de 5 centavos. Estava aberta a catadupa. No ano seguinte, autorizou 178 municípios a imprimirem cédulas, até ao valor máximo de 10 centavos, sendo apenas válidas no concelho emissor. Em todo o país só podiam circular as cédulas emitidas pela Casa do Moeda.
Em 1924, o Ministro das Finanças, Dr. Álvaro de Castro, proibiu a circulação nacional e regional das cédulas fiduciárias, optando por uma política de rigor orçamental, através de um forte aumento de impostos e da diminuição da despesa pública, com vista a travar a descida do escudo. A exploração mineira colonial e a arrecadação dos metais preciosos depositados nos museus e noutros organismos do Estado permitiram voltar à amoedação dos cunhos nacionais e à revalorização do escudo.
O que ficou dessa grave crise económica foi o testemunho material da escassez de moeda, através das cédulas fiduciárias que se imprimiram um pouco por todo o país, algumas delas de rara beleza estética, a imitarem as notas de banco, mas também a divulgarem os padrões culturais dos concelhos em que foram emitidas.
Aqui ficam, como ilustração, algumas cédulas emitidas nos concelhos algarvios, assim como uma da minha terra, Vila Nova de Famalicão, algumas do Hospital dos Arcos de Valdevez, outras da própria Casa da Moeda, e dois exemplares emitidos na Áustria. O coleccionismo destes espécimes monetários em papel, tem sido alvo de atenção dos mercados da especialidade, nomeadamente dos bancos portugueses, sendo disso exemplo a colecção do Dr. António Cupertino de Miranda, que constitui uma parte do seu valioso Museu do Papel Moeda.